"...Minha dor é perceber que apesar de termos feitos tudo que fizemos...

Ainda somos os mesmo e vivemos..."


Não gosto de reforçar algumas coisas negativamente (como dizem os psicólogos), mas hoje vi uma cena que me desorientou não consegui trabalhar até o final da tarde e isto vai ficar na cabeça por muito tempo.


Fui convidada para participar de um projeto com jovens, como gosto, simplesmente costumo brincar com eles dizendo que eles trazem mais vida a minha vida.
Hoje teria apresentação da fanfarra, estavam todos muito bem arrumados e mega ansiosos para a apresentação. A apresentação saiu como planejada tudo lindo e perfeito, a programação na escola seguiu após o termino da apresentação, hoje a escola estava em ritmo de festa - Mostra Cultural dos alunos.

Quando caminhávamos para as finalizações do trabalho, estávamos fazendo a avaliação de como foi positivo a mostra dos alunos. Vi algo que me deixou desorientada.
Dois jovens brigaram, e foi uma briga muito feia e violenta, me machucou só de olhar como eles tinham raiva.

Foi muito forte ver aquela cena e ver a reação das pessoas, que nada fizeram, ate eu e mais um professor começar a gritar para alguém nos ajudar a separar a briga, o guarda da escola fez que não era com ele, o professor com quem eu conversar e presenciou a cena comigo foi logo correndo e tentou separar a briga e daí gritei com o guarda da escola que foi ajudar a acudir.

Chamamos a policia que logo apareceu como o ECA preconiza resguardar qualquer criança ou adolescente, sendo dever de TODOS zelar pelo bem estar da criança e do adolescente, logo me acalmei e pedi para a policia levar um dos meninos embora para casa, pois nosso medo era que algo pior poderia acontecer. A resposta do policial foi que ele não poderia fazer aquilo.

Mais uma vez em contradição: Servir e proteger quem?? E mais o policial nos orientou que não era para nos levarmos o menino embora, pois alguém poderia nos ameaçar.

Fiquei muito indignada com isto, pois estamos falando de um menor de idade, de alguém que NECESSITA ser protegido neste momento e esta totalmente desamparado, o único órgão que conheço que poderia nos auxiliar neste momento negou proteção.

A violência por si só não machuca, pois esta é o resultado de inúmeras coisas que estão por trás, a violência física é apenas o ponto final da questão social
A violência é uma forma de manifestar a expressão da questão social, é uma forma de dizer que as coisas não estão caminhando como deveriam. A violência vai continuar existindo enquanto a política não for garantida. O Estado precisa olhar para estes meninos como meninos e não como delinqüentes.

Vivemos numa sociedade onde o que rege é a coisificação e o senso comum. Você é aquilo que você tem. Coisificação sentimentos acho isso um absurdo. Como os valores estão invertidos.
A desigualdade tende a crescer, e com ela a violência cresce junto. Viveremos assim até quando? Viveremos de brincar de fazer política até quando??

Estes meninos ficam a mercê da sociedade, a deriva da pobreza, a margem, esperando que alguma política de fato os proteja!

Fiquei muito triste, pois isto me tocou diretamente. O que o governo, a escola, a política tem feito para estes meninos se ocuparem, para não serem tentados a cair em caminhos não certo?

O que nos sociedade estamos fazendo? O que a política prevê? O que preconiza o Estado?

Realmente é muito fácil julgar depois, dizer que realmente lugar de "delinqüente" é na FEBEM ou cadeia. Claro nada foi feito enquanto era tempo, nada fizeram enquanto estes meninos gritavam por um pouco de proteção e cuidado. Depois fica fácil e barato tratar pessoas como bichos e jogar na cadeia, impregnando a sociedade de medo, colocando o homem contra o próprio homem. Não construindo nada. Assim dá ibope para estes programas sensacionalista, criminalizando a pobreza, criminalizando a juventude.

A Diretora chegou e nos chamou para sua sala, para continuarmos a avaliação do projeto. Nos serviu café e um pão de queijo deliciosamente cheiroso. Mas minha dor de cabeça voltou mais forte que de manhã, meu estômago estava torcido, na boca uma vontade de vomitar.

Não consegui me concentrar, não conseguia fingir que brigas na porta de escola são rotina ou normal, a cena repetia toda hora na minha cabeça, não consegui comer ou beber o café!

Minha vontade era de fazer uma roda de conversa com aqueles meninos e explicar que temos que nos unir em busca de melhorias e não nos enxergar como inimigos.
Um sentimento de angustia tomou conta de mim, queria fazer algo. mas o que? Como? Começar por onde?

Cadê as autoridades neste momento, cadê os políticos que tanto falam de nossa juventude.
Percebo que os jovens de hoje estão sem perspectiva de vida nenhuma. Conversando com jovem dia desses, ele me disse que se chegar até os 18 anos está bom.

COMO ASSIM??? 18 anos você ainda vai ser um menino, não sabe nada da vida, não começou a viver o melhor da vida, e acha que já viveu o suficiente.
Tenho muito medo dos adolescentes de hoje serem os adultos frustrados de amanha.


Sei lá, disse muita coisa, mas não saiu nada!
Pela primeira vez não muito bem o que fazer. Pois não me contive com a resposta da Diretora:
Os meninos que nem são da escola vem arrumar briga com os nossos alunos.

Que diferença faz, ser ou não aluno da escola? Isso é a expressão da questão social. Uma hora ela te pega não adianta fugir ou fingir que ela não existe, a pobreza, a desigualdade, o senso comum existe em todos lugar basta "querer enxergar."
"... Nos escolhemos não fechar os
olhos para as injustiças do mundo..."

Trecho do filme: Zuzu Angel

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